quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Grandes petroleiras boicotam 13º leilão da ANP, enquanto fantasma do xisto permanece

Apenas 14% dos blocos foram arrematados, segundo pior resultado da história da ANP. Pequenas empresas investem em áreas com potencial de xisto, apesar da briga judicial da rodada passada.

Apesar de enfatizar a palavra "sucesso" sucessivamente, a diretora da ANP Magda Chambriand não conseguia disfarçar o clima de frustração que reinava no encerramento da 13a rodada de petróleo e gás, que acaba de terminar. 
Dos 266 blocos oferecidos, apenas 37 foram arrematados, e os bônus e investimentos totais ficaram bem abaixo das expectativas oficiais. Foi a segunda pior rodada da história da ANP, perdendo apenas para a 5a rodada, em 2003.

Só deu peixe pequeno

Embora todas tenham se inscrito, nenhuma das grandes petroleiras apresentou uma única oferta. A Petrobras tampouco manifestou interesse nos blocos, nem deu qualquer indicação previa ao governo de que assim o faria. A diretora da ANP, que modulou as expectativas para a rodada como "moderadas", sugeriu que a ausência da Petrobras pode ter também levado as estrangeiras a boicotarem o leilão, já que todas querem ser “best friends” da empresa brasileira.


Sociedade civil protesta contra o 13o leilão



Apenas empresas de pequeno e médio porte arremataram blocos, a maioria deles em terra, e não os mais atrativos da rodada. A exceção foram apenas dois blocos na bacia offshore de Sergipe Alagoas, considerada o “filé mignon” da rodada, pela Queiroz Galvão. Isso mesmo, aquela cujo diretor foi preso e está sob investigação na Lava Jato.

Maré baixa

E a falta de apetite das big-oils não foi por falta de cardápio, já que havia blocos interessantes nas bacias offshore de Campos e Espírito Santo. A norueguesa Statoil, que já detém seis blocos no Espírito Santo, deixou de arrematar blocos contíguos aos seus, refletindo o clima de cautela internacional.
O bloco com maior valor de bônus de assinatura, que reflete a maior qualidade geológica do reservatório, não foi arrematado. Segundo a ANP, isso mostra que não foi por falta de qualidade dos hidrocarbonetos ofertados, mas por uma "interpretação de mercado", diante da maré baixa do preço internacional do barril de petróleo. 

Fantasma do xisto permanece

As bacias que tiveram maior sucesso na 13a rodada foram as bacias em terra do Recôncavo Baiano e Parnaíba, com 18 e 11 blocos arrematados, respectivamente. Ambas as bacias têm presença massiva de folhelhos e alto potencial para exploração de recursos não convencionais (gas ou óleo de folhelho, também conhecido como xisto). Várias empresas que arremataram os blocos, como a Imetame, Geopark e Alvopetro já haviam arrecadado blocos na 12a rodada, cujos resultados foram alvo de uma sucessão de ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público Federal (MPF), por falta de regulação específica e pela ameaça de impactos ambientais graves causados pelo uso do fraturamento hidráulico, já reconhecidos mundialmente.
A Oil M&S, que arrematou dois blocos no Recôncavo, é uma das maiores empresas de fraturamento hidráulico da Argentina, e explora gás de xisto em Vaca Muerta, Neuquén, uma das maiores províncias produtoras, e onde já existem impactos graves como contaminação de água e remoção de pessoas.
A ANP é ambígua no tocante à possibilidade de exploração de xisto nesta rodada. Por um lado, a agência retirou do modelo de edital e contrato de concessão desta 13a rodada toda e qualquer menção aos chamados “recursos não convencionais”, argumentando justamente que a questão estava sub judice, e que iriam aguardar o desfecho das ações para poderem tomar qualquer passo na direção de autorizar atividades de exploração de folhelhos por fraturamento hidráulico.
Por outro lado, em recente seminário promovido sobre o tema pelo MPF, quando questionado diretamente sobre se o xisto estava ou não incluído na 13a rodada, o secretário executivo da ANP, Silvio Jablonski, manteve a ambiguidade no ar: por um lado, a lei do óleo confere propriedade ao concessionário de todos os hidrocarbonetos encontrados no bloco concedido; ou seja, nada impede que uma empresa que detenha direitos sobre um bloco, por sua conta e risco, decida explorar recursos não convencionais. Mas na prática, para que isso se efetive, seria necessária a aprovação da ANP para a empresa acessar a rocha geradora. E isso eles prometeram, de pé juntos, em frente aos procuradores presentes na audiência, que não vão fazer.
Na prática, a ambiguidade revela a intenção de manter o xisto vivo, sem levantar suspeitas suficientes para embasar uma ação judicial, e com isso também garantir que a venda dos recursos convencionais, que são mais importantes, também não seja prejudicada por uma eventual paralisação judicial do leilão todo.

Boicote do big-oil revela disputa por “flexibilização” do marco regulatório

O boicote das grandes petroleiras ao leilão de hoje mostra que o clima internacional está ruim, e que o Brasil está em situação doméstica ainda mais complicada em função da Lava Jato. Mas a ausência parece também passar um recado no sentido de que, enquanto o governo não mudar a regulação em sentido mais favorável às empresas, elas vão continuar boicotando. Além das bravatas no Congresso pela alteração do regime do pré sal de partilha para concessão, sinais claros apareceram nessa rodada da ANP.
Durante a consulta pública à 13a rodada, o Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), organização que congrega os interesses das petroleiras, apresentou extenso arrazoado exigindo flexibilizações do modelo regulatório para facilitar a participação das grandes petroleiras diante da crise do óleo. O pacote sugeria a mudança de pontos jurídico-regulatórios como a redução de exigências de conteúdo local, facilitação do licenciamento ambiental e limitação da responsabilidade civil dos concessionários. No caso do licenciamento ambiental, é de se notar que a Associação dos Servidores do Ibama – Asibama vem sistematicamente denunciando a tentativa de desmonte da Coordenação Geral de Petróleo e Gás do Ibama (CGPEG) e a perda de poder da parte técnica em detrimento de decisões políticas que isentam empresas de condicionantes importantes nas licenças.
Durante a entrevista coletiva ao fim da rodada, um dos jornalistas perguntou a Chambriand se agora, diante do fracasso comprovado da rodada, a ANP estaria disposta a considerar essa pauta de reivindicações da indústria. A diretora insinuou um certo clima de chantagem das indústrias sobre o governo, afirmando que o resultado do leilão foi fruto de “contingências externas muito grandes”. A diretoria afirmou que algumas das questões levantadas pelo IBP apareceram só após o fechamento da consulta pública, às vésperas da audiência pública, e que nem na pior rodada da história, as indústrias reclamaram do modelo regulatório, sugerindo que não poderiam esperar que as regras do jogo fossem mudadas no último minuto.

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